sábado, 23 de dezembro de 2006

PEDIDOS PARA DEPOIS DO NATAL

Desculpem! Não consigo fazer coro com vocês... Não consigo cantar essa musiquinha brega... Não consigo beber essa champanha amarga, não consigo engolir essa carne ressecada, não consigo tomar esse vinho ácido. Não, não... o vinho é bom, de boa safra, de boa procedência... mas me sabe a vinagre...

Só vejo sorrisos forçados em bocas de gente com olhar triste... só vejo abraços frouxos e aperto de mãos moles. Mesmo os que me amam. Mesmo destes, nestes dias, sinto uma coisa falsa. Não que não me amem, mas o que eles me dizem não corresponde ao que sinto dentro deles. O que significa esse "Feliz Natal"? O que é ter um "Feliz Natal"!? Por que este Natal tem que ser feliz.. Não quero essa felicidade compulsória... Seja feliz, porque é Natal!!!
Tá, sou feliz... sou relativamente feliz... sou suficientemente feliz... mas não estou feliz... Não, não estou, não agora. Não nestes dias; não com tantas luzes; não com tanta gente, não com tanto barulho...

Sinto vontade de estar só, mas nunca a solidão doeu tanto . Não quero ver pessoas sorrindo. Não as quero por perto. Não quero telefonemas, nem cartões. Façam a festa sem mim. Toquem suas cornetas em outros ouvidos. Assoprem seus apitos estridentes em outra direção. Deixem-me só, com meu mau humor, com minha cara fechada, com meu silêncio. Deixem-me ficar abraçado à minha dor. Ela não passa, nestes dias. Acho até que fica maior, ao lado de tanta felicidade, de tanto barulho, de tanta luz...

Mas, por favor, quando tudo isso passar, quando a fumaça dos fogos se dissipar em névoa fina, quando o barulho ensurdecedor dos estampidos sumir e os bebês apavorados pararem de chorar, vencidos pelo cansaço; quando os cães sarnentos das ruas, saírem assustados de seus esconderijos, com o rabo entre as pernas e as orelhas abaixadas a procurar o alimento farto que foi jogado no lixo; quando finalmente houver silêncio, um silêncio de ressaca, um silêncio de morte; quando o sol finalmente surgir e iluminar a praia poluída por garrafas vazias, flores murchas, bitucas de cigarro, coxas de frango, camisinhas usadas; quando o cheiro doce da maconha se dispersar; quando a luz da primeira manhã bater nos olhos remelentos da criança nua que cata restos de tender e panetone, em meio às baratas; quando a primeira chuva trouxer a primeira enchente a lavar as ruas com urina de rato; quando as guirlandas douradas forem destruídas pelo aguaceiro e os celofanes rubros derreterem, levados pela ventania uivante... por favor, nessa hora não se esqueçam de mim...

Preciso de vocês aqui. Preciso saber que estão comigo, se algo me acontecer. Preciso saber que estarão por perto, se eu chorar, se sentir medo, se conseguir fazer algo sensacional, se eu cair no chão e fizer um talho na cabeça, se chover muito forte, se trovejar muito perto, se o vento assobiar, se eu fizer um gol bonito, se cantar uma canção, se me sentir apaixonado, se tremer de frio, se ganhar uma corrida, se fizer uma boa ação. Preciso de vocês, próximos de mim, porque pode acontecer de eu ficar com febre, ou vomitar, ou desmaiar.

Preciso de vocês porque meu coração pode parar de bater a qualquer momento e aí, nessa hora, se vocês não estiverem comigo, quem vai segurar na minha mão...???!!!

quinta-feira, 21 de dezembro de 2006

O PSEUDÔNIMO

Pensou muito, antes de escolher. Alexandre; grande demais. Palmério; esquisito. Sempre lhe vinha à cabeça Fernando Pessoa. Então decidiu. Ao mesmo tempo em que homenageava o cara que mais criou pseudônimos – tão complexos e com vida tão própria, que até foram chamados de heterônimos – criaria o seu com facilidade. Por que não pensou nisso antes? Tantas combinações possíveis: Alberto Reis; Ricardo Caieiro, Álvaro Pessoa, Fernando Reis, Alberto de Campos. Resolveu dar um nome de cada um: Ricardo de Campos Caieiro. Achou bonito, nobre, com cara de escritor mesmo.
Tudo isso pra esconder sua identidade. Há muito tempo vinha visitando blogs pela Internet. Ficou fascinado pela diversidade e qualidade dos sites desse tipo que encontrava. Era um universo vasto e interessante. E tão acessível. Que coisa democrática, isso. Qualquer um podia escrever sobre qualquer assunto, publicar imediatamente e, também imediatamente, receber o retorno dos leitores, que podiam ler seu artigo no exato momento em que ele entrava no ar. As possibilidades eram fantásticas. Há tempos pensava em começar a escrever , mas pra que? Pra quem? Agora tudo ficava fácil. Quer dizer, quase tudo. Jamais teria coragem de se expor tanto. Seus escritos eram muito confessionais. Era como ficar nu. Mas, até isso era facilitado pela Internet, o ambiente mais falso do mundo, onde qualquer um pode ser o que quiser, inventar nomes, personalidades, mudar de sexo, brincar de ser qualquer coisa. Aí sim se sentia seguro. Não era ele que iria escrever, mas uma outra pessoa, chamada Ricardo de Campos Caieiro. Pra não complicar as coisas e poder cuidar somente dos textos, não inventou uma personalidade; nada além do nome. Era um cara da idade dele, do jeito dele...ele mesmo. Só o nome mudava. Era o suficiente pra se esconder.
Abriu o blog e começou a escrever tudo o que lhe vinha na cabeça. Passou a visitar outros blogs, mas agora não mais anônimo; vinha com sua nova personalidade: Ricardo de Campos Caieiro.
E com esse nome, fazia comentários, convidava as pessoas pra visitar o seu próprio sítio. Pra dar um charme, assinava seus posts e comentários apenas com as iniciais R.C.C., criando uma marca que logo passou a ser reconhecida no meio.
Sua audiência foi aumentando. E seus textos , sempre muito bons, geravam muitas discussões. Começou a ficar popular no meio. E sua notoriedade extrapolou o ambiente digital. Passou a receber chamados da imprensa para dar entrevistas. Naturalmente tinha que recusar, pois Ricardo de Campos Caieiro não existia. Como apresentar-se fisicamente com um nome diferente do seu? Isso já seria fraude, falsidade ideológica, crime mesmo. Só aceitava entrevistas por e-mail, o que dava até um certo charme de cara recluso, figurinha difícil. Precisava recusar sistematicamente os encontros, que o pessoal virtual acabava marcando em barzinhos, pra se conhecer pessoalmente, beber e prosear. Ele não existia na vida real. Coisa mais estranha isso. Ele era seu próprio personagem, preso na sua própria criação.
Aquilo começou a incomodar demais. Sua popularidade já era grande. Começou a ter vontade de conhecer as pessoas com quem trocava idéias. Gente tão interessante! Umas mulheres inclusive bonitas. Ele não podia revelar nem sua imagem pessoal. As pessoas ficavam cobrando. Também queriam conhecer o cara que escrevia tão bem. Ele tinha o maior sucesso e não podia desfrutar disso, porque simplesmente não existia. Coisa mais absurda. Esquizofrênica, mesmo.
Precisava dar um basta naquilo. Então, decidiu revelar sua verdadeira identidade, seu verdadeiro nome. Que diabos, afinal todo mundo pode ter um pseudônimo, isso era uma prática comum. Até Nelson Rodrigues teve pseudônimo; e ainda por cima feminino: Suzana Flag. Não seria mal visto por isso. Muito ao contrário; seria uma atitude muito interessante revelar que ele não era ele. Ficou quase eufórico com a idéia.
Imediatamente foi pro computador, abriu o site do blog, entrou com seu login, digitou a senha e, assim que a tela em branco se abriu, começou a escrever o derradeiro artigo de Ricardo de Campos Caieiro. Caprichou na trama. Foi criando um suspense que culminaria com a grande revelação, na última frase. Fez ainda um P.S., explicando que, dali pra frente, os artigos do seu blog seriam assinados pela sua personalidade real, ele mesmo, que, de resto, era quem tinha escrito tudo aquilo até ali. Leu o texto. Achou bom. Com a dose certa de surpresa. Sorriu ao imaginar como as pessoas receberiam a notícia. Moveu o mouse. O cursor foi se aproximando do botão virtual. Quando chegou à palavra "PUBLICAR", pressionou o botão esquerdo.
A tela tremeu e de imediato, escureceu. O cursor sumiu e voltou na forma de um traço branco piscando no canto superior esquerdo. Apertou o botão do mouse mais uma vez. Nada. Tentou escrever algo. O cursor não se movia. "Cacete, computador é uma merda mesmo", pensou. Ficou olhando aquela tela preta, sem saber o que fazer. De repente, o computador começa o processo de inicialização. Respirou um pouco aliviado, mas meio tenso ainda. "Será que perdi todo o artigo?". Não; o servidor do blog tinha um sistema de salvamento automático, para o caso de acontecer estes travamentos tão comuns. Esperou a inicialização. Quando terminou, conectou-se novamente, digitou o endereço do servidor e na tela de identificação, digitou seu login e sua senha. "Seu login ou senha não correspondem. Favor tentar outra vez". Como assim? Digitou novamente, bem devagar, olhando cada tecla que apertava. "Seu login ou senha não correspondem. Favor tentar outra vez". Ué, que estranho... Foi pra página principal do site e deixou uma mensagem para o suporte técnico, dizendo que não estava conseguindo conexão. Descreveu o problema sucintamente.
No dia seguinte, abriu sua caixa de mensagens e encontrou um e-mail do suporte. Dizia que "o sistema não reconhece este login e esta senha. Se desejar poderá entrar em nossa página de cadastro e fazer sua inscrição". Cacete... Como não reconhece... tentou outra vez... nada. Então resolveu acessar o endereço do seu blog pra ver se, pelo menos, o artigo tinha sido publicado. Quase caiu da cadeira. O blog estava todo mudado, cores, fontes, tudo. Seus artigos anteriores ainda estavam lá, mas já havia quatro novos artigos assinados por ele, isso é, por Ricardo de Campos Caieiro. Artigos que ele não havia escrito!
Pensou: "Fui invadido por um hacker". O cara mudou minha senha e meu login e está zoando com o meu blog. Ficou putíssimo. Decidiu ligar para o suporte técnico. Depois de meia hora tentando, foi atendido.
-Suporte técnico Interblog. Em que posso ajudar?
- Alguém entrou no meu blog. Mudaram senha e tudo.
-Seu nome, Sr.
-Orlando Mitre.
-Qual o seu login, senhor?
-"mascarado", tudo minúsculo...
-Um momento...
-Sr., não consta no sistema esse login, sr.
-Como não consta? Sempre entrei com ele... É "mas-ca-ra-do", tudo com minúsculas...
-Estou verificando, sr. Não consta. E nunca tivemos esse registro anteriormente.
-Cara, é o seguinte. Eu tenho um blog hospedado aí nesse servidor há mais de seis meses. Entro nele várias vezes ao dia com o mesmo login e a mesma senha. Eu não estou louco e não esqueci meu login nem minha senha. Alguma coisa aconteceu. Não consigo entrar e alguém já publicou vários artigos assinados por mim, quer dizer, pelo meu pseudônimo. Eu não escrevi estes artigos e não os publiquei. Meu acesso foi cortado! Alguém invadiu o sistema, ficou com minha senha e mudou tudo.
-Impossível senhor. Nosso sistema de criptografia de chave dupla é inviolável para as senhas. Mesmo que alguém soubesse o seu login, não conseguiria acessar sua senha, sr.
- Olha, querido, veja aí este endereço que eu te passei. Estes quatro últimos artigos não são meus. Estão assinados por mim, isto é, pelo meu pseudônimo, mas não são meus...
-Um instante, sr... O sr. disse que usa um pseudônimo?
-Isso mesmo.
- É esse aqui que assina? R.C.C.? R, de rato, ponto, C de casa, ponto e C de casa, ponto, novamente?
-Exato.
- Temos este login validado no sistema, sr. Não é o seu?
-Não, não é... isso é só um pseudônimo. Meu login é esse que eu falei: "mascarado", tudo minúsculo.
-Desculpe, sr. este login não corresponde ao endereço que o sr. me forneceu.
-Você pode me fornecer a senha desse outro login?
-Desculpe, sr. Não podemos fornecer senhas. Algo mais em que eu possa ajudá-lo?
-Vocês têm que dar um jeito nisso. É um absurdo!
-Desculpe, sr. Se quiser, o sr. pode entrar em nossa página de cadastro e fazer um novo cadastro. O sistema irá lhe fornecer um novo login e uma nova senha...
-Caralho, porra, eu não quero novo login e nova senha. Quero o meu login e minha senha de volta!!
-Algo mais, sr?
-Vai tomar no cu!!!!
-O suporte técnico agradece seu contato. Tenha uma boa tarde.
Bateu o telefone com estardalhaço. Ficou parado, ofegante de raiva, sentindo o coração disparado. Não conseguia entender como isso tinha acontecido. Teve uma idéia. Tinha todos os endereços de e-mail do pessoal que conheceu. Preparou uma mensagem, onde dizia que tinha sido invadido por alguém que assumiu seu pseudônimo, mudou os dados de acesso do seu blog e passou a escrever artigos assinados por Ricardo de Campos Caieiro, seu pseudônimo, e que estes artigos eram falsificações, assim como tal pessoa não existia...etc... Assinou: Orlando Mitre. Enviou a mensagem para todos os da sua lista.
Em seguida, digitou o endereço do blog e a tela se abriu mostrando um texto em vermelho:
"Caros leitores e queridos amigos. Tenho recebido ameaças de algum hacker, dizendo-se dono deste espaço. Ele assina com o pseudônimo de Orlando Mitre e já tentou obter meus dados de acesso ao blog. Caso recebam alguma mensagem com este teor assinada por ele, por favor desconsiderem e, se possível, denunciem ao administrador do site. Já fiz uma denúncia formal ao servidor que está tomando as medidas judiciais cabíveis. Espero que este fato não venha a atrapalhar nossa convivência virtual tão gostosa e profícua. R.C.C."
Ficou lívido, estático. Não conseguia pensar em nada. Sua cabeça era um caldeirão em ebulição, mas não conseguia nem se mexer. Estava neste estado quando o interfone tocou, estridente. Levantou-se meio cambaleante e foi até a cozinha. Atendeu.
-Seu Orlando. Tem uns homens aqui querendo falar com o sr.
-Homens? Que homens?
-Tão dizendo que são da polícia federal e querem subir.
-Você pediu identificação?
-Pedi, sim sr. E eles têm um papel que dizem que é uma intimação.
-Tá bom. Pode subir.
A campainha soou.
-Sr. Orlando Mitre?
-Sim.
-Polícia Federal.
-Eu sei.
-Temos uma intimação para o sr. Deve nos acompanhar para prestar depoimento.
-Mas, do que se trata?
-Recebemos uma denúncia do servidor Interblog. O sr. está sendo acusado de tentar violar conteúdo do site, inclusive com roubo de senhas e dados dos associados do servidor.
-Eu?!! Mas isso é um absurdo! Eu é que estou sendo violado. Quais são as provas?
-Um usuário do sistema coletou e entregou como prova, material digital que está sendo periciado.
-Que material?
-Mensagens que o sr. enviou a toda lista de contatos dele, dizendo-se dono do site. Temos também o depoimento de um funcionário do suporte técnico acusando-o de tentar induzi-lo a fornecer a senha do senhor Ricardo de Campos Caieiro, fazendo-se passar fraudulentamente por ele. Além disso, a prova mais contundente é que o seu computador foi identificado pelo sistema como tendo enviado textos ao blog do Sr. Ricardo Caieiro, utilizando-se login e senhas de acesso dele.
-Sr. policial, este homem não existe. Foi um pseudônimo que inventei para poder escrever sem revelar minha identidade. Os textos são meus. Claro que foi do meu computador. Fui eu que enviei.
- O sr. confirma que enviou arquivos para o servidor Interblog, utilizando login e senhas em nome de Ricardo de Campos Caieiro?
-Pelo amor de Deus, gente! Esse é um nome fictício. Foi montado dos nomes dos vários heterônimos de Fernando Pessoa. Conhece Fernando Pessoa?
-Não, sr. Por favor, queira nos acompanhar.
Desistiu de argumentar. Na sede da polícia, poderia esclarecer tudo. Pegou uma jaqueta e saiu com os policiais.
Chegou ao edifício grande, no centro da cidade, desceu da Blazer preta e foi caminhando até o elevador, escoltado por um policial de cada lado. Pelo menos não o algemaram. Já tinha visto várias vezes na TV aquela humilhação por quê passavam os presos algemados e praticamente jogados na parte de trás do carro, sem conseguir nem se apoiar.
Entrou no elevador e acompanhou o contador até o décimo segundo andar. Saiu, com os homens sempre a seu lado, e entrou na segunda sala. Havia uma mesa grande, tipo mesa de reunião. Na cabeceira, um homem grisalho de terno levantou-se:
-Sr. Orlando, sou o delegado Ramirez, estendendo-lhe a mão, mas com o semblante carregado. Meus homens já devem ter adiantado o motivo da intimação.
-Dr. Ramirez, deixe eu ...
-Sr. Orlando, disse o delegado interrompendo. Antes de mais nada quero avisar-lhe que não deve dar nenhuma declaração sem a presença de um advogado. Se não tiver um, providenciaremos um defensor público. Esta reunião é apenas para apresentar-lhe a parte contrária que fez a denúncia de crime de violação e furto de dados digitais. Virou-se para o policial e fez um sinal com a cabeça.
Orlando Mitre ficou olhando para o delegado, sem saber o que dizer e não entendendo mais nada.
Uma porta lateral se abriu e, acompanhado do policial e de outro homem alto, carregando uma pasta preta, entrou um senhor de mais ou menos cinqüenta anos, usando um bigode estilo antigo, bem aparado, num terno de corte fora de moda, com colete, relógio de bolso com corrente de ouro e uma bengala com pegador de marfim. Ao cumprimentá-lo, mesmo sem as apresentações, inclinou-se e fez uma mesura tirando o chapéu, dizendo com forte sotaque português:
- Senhor Orlando Mitre! Finalmente estou a conhecê-lo, pois sim? Meu nome é Ricardo de Campos Caieiro. Acho que já nos conhecemos virtualmente, pois não?
Orlando Mitre, boquiaberto, deixou-se cair na cadeira e sentiu um formigamento no corpo. Desmaiou.
Acordou de repente, gritando, angustiado. Levantou tão rápido, que o notebook caiu do seu colo, no sofá. Abriu a tela e viu o cursor piscando na última frase do artigo que escrevera revelando sua verdadeira identidade. Apertou a tecla Ctrl, selecionou o texto todo e pressionou Delete.
Achou melhor abrir outro blog com seu nome e deixar Ricardo de Campos Caieiro, o R.C.C., seguir sua carreira brilhante. Afinal, Fernando Pessoa conviveu com, pelo menos, quatro heterônimos dentro dele.
Ou será que tentou eliminá-los e não conseguiu...?

quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

PROMOÇÃO: ABRAÇOS GRÁTIS!

Sincronicidade existe. Não é uma invenção do Carlos Gustavo Jung.
Mandaram pra mim esse vídeo. Não sei se quem mandou, leu o post abaixo intitulado "Quero Colo". Não importa. Publico aqui, em seguida, como contraponto, bem do jeito que a vida é... surpreendente e irônica.
Ligue o som!


sábado, 9 de dezembro de 2006

QUERO COLO!

"Morrer deve ser tão frio, quanto na hora do parto"*

Gilberto Gil

-Já cortou o cordão?
-Pronto!
-Mostra pra mãe.
-Olha que lindo o seu bebê.
-Põe meu menino aqui no meu colo...

-Tá chorando!
-Vem no colo da mamãe, vem.
-Hora de mamar, querido...

-O que aconteceu? Caiu, meu filho..
-Ai, ai, ai que dodói..
-Vem aqui no colo da mamãe que passa...

-A gente perdeu, pai... De três a zero...Droga!
-Não fica triste, meu filho... Depois você ganha o próximo.
-Eu perdi um pênalti, pai!
-Vem aqui no meu colo, vem... Perder faz parte do jogo.

-Mãe, eu adoro ele, mãe...Ele não tá nem aí comigo!
-Não liga, não, minha filha. Vai passar. Tem muitos outros por aí..
-Mas nenhum como ele, mãe!
-Vem aqui no meu colo, vem....

-Querida, como eu amo você!
-Meu amor, deita aqui no meu colo...

-Ai, que delícia! Como foi bom...
-Nossa! Nunca foi tão forte... Tô até tremendo...
-Vem cá no meu colo, meu bem...

-Eu juro que vi, mãe... Tenho certeza. Saindo do motel...
-Vai ver era outra pessoa, filha...
-Não mãe, não era não. Nunca pensei que isso ia acontecer com a gente...
-Vem cá filha, fica aqui no meu colo... Vai passar...

-Mamãe.. o papai não resistiu...
-Ai, meu Deus... Ele era tão forte? Como eu vou fazer sem ele, agora?
-Eu estou aqui com você, mãe. Encosta aqui no meu colo...

-A mamãe morreu!
-Ah, meu Deus, que coisa triste...
-Todo mundo vai, um dia...Deita no meu colo... descansa um pouco.

-Olha o monitor...
-A freqüência está baixa, né..
-E a pressão também... Tá sem ritmo...
-Melhor chamar o Dr.
-Coitado! Dá vontade de pegar no colo... tão sozinho... ninguém da família veio hoje...
-Colo não pode dar... Mas pega mais um travesseiro pra ele...
-Não, não adianta mais. Olha o monitor...
-Parou!....

* ...com a diferença que, depois do parto, a gente vai para um colo de mãe; depois da morte... tem colo?

Ilustração: Mira Reisberg

sábado, 2 de dezembro de 2006

FICA COMIGO!



F E C U N D O*

“De desejar-te, imaginei-me tu.

Sem perder consciência do meu arfar por ti,

percorro-me inquirindo-te em todo mim,

vejo-me, toco-me porque sou todo tu,

e amo-me em ti que me dás forma e vazas de mim em mim.”

ABGAR RENAULT



Tu me fecundaste com a tua vida.


Corres, vermelha, pelas minhas artérias.

Contrai-te, súbita, nas minhas fibras.

Brotas, límpida, dos meus olhos,

Rolas, líquida, por minha face.


Infla-te, lenta, quando inspiro...

Sais, a esmo, quando suspiro.

Corro...acelera tuas sístoles,

Deito...tu te aquietas.


Se penso, vens aderida...

Se sonho, vens à deriva.

Olho-me e vejo-te.

Toco-me e sinto tua meiga penugem.

Procuro-me...encontro a ti.


Tu me fecundaste com a tua vida...

No entanto, sinto o frio da morte.



*Escrito em janeiro de 1992.