segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

SÃO VITO E O MERCADO


Este edifício do lado esquerdo, com detalhes na primeira foto do lado direito, abaixo (clique para ampliar), é um dos mais conhecidos de São Paulo. Tão conhecido quanto o Edifício Copan, o Edifício Itália, o Martinelli e o Conjunto Nacional. É uma referência. Ou, talvez, uma "anti-referência". Chama-se Edifício São Vito e é o mais perfeito emblema da deterioração da cidade. Ou, pelo menos do centro.
Construído em 1959, ao lado do Parque D. Pedro II, tem 25 andares, com 624 apartamentos e chegou a abrigar três mil moradores. Seguiu o inexorável caminho da ruína da metrópole, até se transformar numa favela vertical, ocupado inclusive por traficantes. É o equivalente dos morros do Rio; nem a polícia entrava.
Em 2004, um projeto de revitalização do centro cogitou recuperá-lo e foi, então, desapropriado e interditado. Permaneceu assim, até que o projeto foi abandonado, conforme se sucediam as novas administrações. Esta lá, desse jeito, até hoje.
Fala-se em sua demolição, para dar lugar a uma praça. Enquanto isso, fica assim, expondo a alma de uma cidade cheia de cicatrizes. Ao seu lado, fica outro edifício marcado pelas pichações. Parece um corpo cheio de tatuagens.
Ironicamente, estes dois cadáveres, decompondo-se a céu aberto, ficam bem em frente (mais uma vez o clichê da cidade dos contrastes) a um dos prédios mais bonitos daqui. Este é um velho senhor. Em 25 de janeiro último, aniversário da cidade, completou 73 anos. Mas goza de boa saúde e recentemente fez uma "plástica" que lhe devolveu a jovialidade. É o Mercado Municipal.
Foi projetado pelo famoso arquiteto Ramos de Azevedo, em 1924, que tem presença marcante nos edifícios importantes da cidade: são dele o Teatro Municipal, a Pinacoteca do Estado (já restaurada e linda) e o Prédio Central dos Correios e Telégrafos (em recuperação), entre outros.
O Mercadão, como é conhecido, reconquistou sua nobreza e caiu no carinho dos paulistanos. Além das bancas que vendem os melhores artigos, onde até chefes de cozinha vão buscar seus temperos e segredos, foi construído um mezanino para onde "subiram" os bares que existiam no piso térreo. Tem até um restaurante japonês. Mas os quitutes mais famosos são o bolinho de bacalhau e o sanduíche de mortadela. É um passeio bem legal.
Clique na foto abaixo para conhecer um pouco do interior do Mercadão e ver como ele é bonito e charmoso.

quarta-feira, 24 de janeiro de 2007

FALANDO UM POUCO DE MIM




Comecei este espaço, falando intencionalmente de coisas banais, assuntos, digamos, externos, que não comprometiam, nem dependiam do meu estado de espírito. Foi uma atitude deliberada e coerente com essa abordagem impessoal e distanciada dos temas. Quanto menos confessional e mais universal, melhor.
Valia também a ficção, pura ou misturada com a realidade, num exercício criativo. Fiz, também, a proposição de ser leve, bem humorado, mesmo eventualmente tratando de temas dramáticos.
A estrutura gráfica, eu a pretendia a mais multimídia possível, seguindo a tendência do veículo, por natureza e vocação.
Durante alguns meses , este espírito foi alcançado.
Mas, a partir de um determinado ponto, minha alma começou a exigir participação nessa festa. E, por mais que tentasse ser fiel às minhas propostas iniciais, os textos começaram a assumir um tom mais amargo e melancólico.
Foi assim que começaram a aparecer coisas como as que escrevi em "Fica Comigo", "Quero Colo", "Promoção: abraços grátis", culminando com o último "Pedidos Para Depois do Natal".
A partir deste, escrito às vésperas do Natal - e cuja atmosfera é de uma amargura imensa - não consegui mais escrever uma linha sequer. Isso gerou em mim uma angústia profunda. Quanto mais eu tentava, menos conseguia. Quanto menos conseguia, mais a angústia se aprofundava. Alguma coisa parecida - e acho que não é só parecida, mas é a mesma coisa - com aquela situação em que um homem brocha e fica tentando obsessivamente ter uma ereção. Quanto mais ele tenta, mais longe vai ficando a possibilidade de conseguir. Essa é a hora de relaxar e não gozar.
Procura o Let It Be, dos Beatles - de preferência a versão "naked" - põe pra tocar e "deixa estar"...
Refletindo sobre isso, na tentativa de entender o fenômeno, continuei não entendendo nada, mas fiz algumas observações curiosas.
A mudança de tom nos textos, começou logo após meu aniversário. Falam de um tal de "inferno astral", uma espécie de TPM espiritual que antecede o período astrológico do nascimento, mas que, como a TPM, e como o próprio nome diz, deveria ocorrer antes da data e não depois, como aconteceu. A coisa foi se intensificando nos exatos 30 dias que separam meu natalício do Natal. O último texto - e o mais ácido de todos - foi escrito no dia 23 de dezembro e depois disso nada mais aconteceu.
É como se, a partir do aniversário, meu conteúdo mais interno e verdadeiro aumentasse de tal forma sua pressão para se manifestar, que ficou impossível contê-lo. Não por acaso, o único texto ficcional que escrevi neste período, tratava de um personagem que escrevia sob um pseudônimo ,o qual toma vida própria e se volta contra o autor real.
Depois da catarse, entrei num estado de ressaca, um bode, uma rebordosa idêntica àquela provocada pela bebedeira. Só de cheirar o uísque a dor de cabeça e a náusea voltam.
Passei estes dias, entre o Natal e a minha volta ao trabalho, num estado meio catatônico. Não conseguia ler, não conseguia pensar e, portanto, não conseguia escrever. Uns poucos "insights" espoucavam como flashes, mas eram exatamente isso: tão fugazes quanto a luz e sumiam imediatamente.
Por ironia, tinha todo o tempo do mundo para escrever, elaborar a idéia, lapidar o texto...mas um vazio, um buraco negro, um fundo infinito, tomavam conta da minha cabeça.
Ao mesmo tempo - pra piorar - uma preguiça física me mantinha deitado no sofá, controle remoto na mão, zapeando a uma velocidade de dois canais por segundo, com o olhar perdido e a boca aberta, o que me dava um fácies de imbecilidade. A aparência era um espelho perfeito de como estava me sentindo.
Estranhamente, exatos 30 dias após minha última publicação, volto a publicar. E não pude fugir do tema. É, talvez, uma coisa de encarar o trauma. Não fingir que não existe. Falar sobre ele, talvez seja a única forma de destravá-lo.
Desde já, peço desculpas aos amigos que fiz aqui, não só pela ausência até então não justificada, mas pela desinteressante prestação de contas que, de resto, vale mais para mim mesmo do que para vocês.
O lado bom da coisa - e parece que ele sempre existe - a notícia boa, é que os poucos loucos e loucas carinhosos que freqüentam esta praça, estes vizinhos virtuais, tão próximos e, ao mesmo tempo tão impalpáveis, tão invisíveis, mas cujo carinho é bem real, bem palpável e bem visível, estes amigos e amigas que fazem com a palavra escrita e com uns poucos ícones, afagos tão suaves quanto suas mãos poderiam fazer - estas pessoas estiveram comigo este tempo todo. Manifestaram sua saudade, sua preocupação, sua solidariedade, sua vontade de estar junto. Ao mesmo tempo, tiveram a generosidade de esperar e souberam dizer "estamos aqui; estaremos aqui quando você voltar". E até levantaram um brinde, com receita especialmente formulada para curar a falta de energia. Quem quiser a receita, clique aqui.
Isso tudo pode parecer besteira para alguns. Há quem deteste computadores, internet, blogues, correio eletrônico. Há quem zombe de quem se envolve com isso. Há quem duvide da possibilidade de se estabelecer relações afetivas verdadeiras, virtualmente. Respeito-as.
A comunicação virtual subverte a ordem das coisas. Nossos instintos atávicos clamam desesperadamente por um contato visual, um cheiro, um toque, o timbre de uma voz. É assim que fazemos desde que a raça ocupou o planeta. Os sentidos indicam se gostamos ou não, se queremos manter contato ou não.
Contudo, para nós da raça humana, isso é apenas o começo. Apenas estabelece o "link" inicial. Depois de algum tempo, tudo passa a ser o que realmente é: acessório. E o essencial, o diálogo de idéias, a busca das afinidades e idiossincrasias, o que existe de enriquecedor no outro, a visão da alma do interlocutor e seu caráter, estes valores passam a exercer o papel de indicadores. E daí pra frente é isso que interessa.
No contato virtual esta ordem é invertida. Conhecemos primeiro a essência. Fica faltando o acessório. Mas, não é nada mais do que isso: acessório. Mesmo porque, estamos falando de amizades; relações com pessoas afins que se gostam mais ou menos e cuja convivência permite o enriquecimento de cada um através da livre circulação de... idéias. Idéias sem cheiro, sem cor, sem olhos azuis, sem som. Passamos a gostar uns dos outros pelas idéias, pela inteligência, pela sensibilidade, pela criatividade, pelo humor.
Para o encontro amoroso, talvez haja outra dinâmica. Mas isso é assunto para outro texto.
A foto que abre este artigo foi a primeira (e única, até agora) que fiz em 2007.
Eu a escolhi, pelas circunstâncias. Foi feita no litoral, em um dia em que a previsão meteorológica era de tempestades e chuva forte, o que aliás vinha ocorrendo há mais de quinze dias. É um janeiro que já bate recordes pluviométricos. Fui para a praia, atendendo um compromisso que podia até ser adiado pela expectativa do dilúvio. De fato, o dia passou com nuvens negras e com o horizonte pesado. Contudo, ao cair da tarde, uma brisa começou a soprar e a cortina de nuvens negras começou a se abrir e foi abrindo, abrindo até entregar uma noite completamente estrelada.
No momento da foto, é possível ver a camada de nuvens se dispersando, mostrando fragmentos do céu azul e um sol poente tingindo o horizonte de amarelo e vermelho.
A cena não me prendeu apenas pela beleza estética. Achei aquela visão metafórica do que me ia na alma. E vi aquilo como um bom presságio de que as tempestades não duram pra sempre. Mesmo as da alma que fica escurecida pelas nuvens da melancolia.
Fiz a foto e, naquele mesmo momento, prometi que seria publicada no primeiro artigo que escrevesse no novo ano, como uma imagem e uma metáfora de que a luz vai sempre aparecer. É apenas mais um dos infindáveis ciclos que a vida e a natureza comandam.


Obrigado a todos os que estiveram aqui. Não vou nomeá-los. Vocês sabem quem são.